“Estamos a olhar proativamente aquisições cá, em Espanha e até fora”

No dia em que apresenta os novos nomes das suas diferentes divisões – Glintt Life e Glintt Next – o líder da Glintt Global, Luís Cocco, revela em entrevista ao JE os planos de crescimento da empresa portuguesa. Aquisições em 2024?

Sim, provavelmente. E mais contratações, porque os maiores ativos da empresa não se vêem no balanço, são as pessoas, diz.

A Glintt duplicou os lucros em 2022. Como é que vão ser os resultados de 2023, que vocês só anunciam em abril? Será o mesmo tipo de progressão?
Como disse só vamos divulgar os números em abril. Os números públicos que temos são os de setembro e estamos a fazer 90 milhões – 10 milhões certinho por mês. Portanto, os números preliminares mostram que chegámos aos 120 milhões de euros em 2023.

Em 2022 faturaram 112 milhões…
É. O nosso objetivo é crescer 8 a 10 milhões por ano. Portanto, chegámos aos 120 milhões e, em termos de rentabilidade, que também é uma das nossas prioridades, também vamos crescer o resultado líquido de forma significativa.

Em que áreas? O que é que está a puxar por isto tudo?
Tudo. Agora organizámos em duas grandes áreas, mas uma das áreas tem três [divisões]. Todas as áreas tiveram uma performance excelente em 2023. Os objetivos de rentabilidade todas cumpriram. Ou seja, são resultados não só bons quantitativamente, mas qualitativamente também. Todas as áreas estão bem. Às vezes, historicamente uma estava pior e outra compensava. Este ano todas cumpriram os objetivos de rentabilidade. E, portanto, estamos muitíssimo bem. Eu até faço assim [bate na madeira], mas acho que 2023 foi um ano espetacular e estou muito otimista sobre 2024 também.

Luís Cocco, apresente a Glintt. 

Nós somos, primeiro que tudo, uma empresa tecnológica. Reconhecidamente. E temos duas grandes áreas: atuamos verticalmente no mercado da saúde. E tudo isto aplica-se a Portugal e Espanha. Ou seja, desenvolvemos soluções tecnológicas, software e associadas, para o mercado da saúde, sobretudo hospitais e farmácias, onde somos líderes em Portugal e Espanha. Eu gosto de frisar ‘Portugal e Espanha’ porque não é normal uma empresa portuguesa, sobretudo de tecnologia, ser líder em Espanha. E nós somos. 

O que precisa uma farmácia em termos de software?

 Tudo: atendimento, stocks, faturação. Portanto, o software gere tudo numa farmácia, inclusive coisas mais sofisticadas como o cross-selling. Alguém compra uma coisa e o software propõe logo outra. O software pode detetar que está a tomar dois medicamentos que, terapeuticamente, não deveria estar a tomar. E avisa. Gere, por exemplo, outra coisa que é muito importante: os robôs. Cada vez mais as farmácias têm os medicamentos estocados em robôs. Que têm muitíssimas vantagens. Desde logo, há maior controlo de stocks e deixa de haver perdas. O espaço está muito mais otimizado e, sobretudo, no atendimento a pessoa que está ao balcão não tem de sair da frente do cliente. Ou seja, está sempre no balcão, o software dá ordem a um robô que envia o medicamento e a pessoa que está ao balcão está sempre à frente do cliente. E pode ter mais uma oportunidade para venda. 

Ganha minutos de interação com o cliente. 

Cada vez mais a farmácia é um negócio de retalho. Aqui há uns anos era sacrilégio dizer isto, porque o farmacêutico dispensa medicamentos, mas é um negócio de retalho e o que interessa é rentabilizar ao máximo a venda. Ok, isso é o software para as farmácias. Portanto temos uma área vertical no mercado da saúde. E nessa área da farmácia temos produtos próprios, softwares nossos, da Glintt. Depois, a outra área é tecnologia, em que também desenvolvemos aplicações para grandes empresas portuguesas e espanholas, tipicamente para as 200 maiores empresas portuguesas e para as 500 maiores espanholas. Aí competimos com outras áreas, mas trabalhamos com tudo. Por exemplo, a Chave Móvel Digital que nós todos utilizamos [na maioria dos portais de contacto dos cidadãos com o Estado] foi a Glintt que fez. Somos o parceiro tecnológico principal da AMA (Agência para a Modernização Administrativa).

E por sectores, com quem trabalham mais? 

Trabalhamos com os sectores que intensamente gastam em tecnologia: banca, energia, telecomunicações e administração pública.

E aí trabalham em soluções à medida do que eles querem. 

Exatamente. Aplicações, interfaces, tudo. Agora está muito na moda a Inteligência Artificial.

O que é que as empresas agora estão a solicitar á Glintt na área da IA?

 Tipicamente, todas estas empresas estão já há vários anos num processo de digitalização e transformação tecnológica e têm orçamentos de IT muito elevados. Agora, tudo o que diz ‘Inteligência Artificial’ tem um apelativo especial. Qualquer empresa hoje quer fazer qualquer coisa com Inteligência Artificial.

Mas essa é a minha dúvida. As empresas querem soluções de raiz? Ou querem pôr Inteligência Artificial em cima de uma solução que já têm? 

Querem aplicar a IA em alguma parte dos seus processos de negócio ou da oferta. A solução que todos foram muito no início era o atendimento ao cliente, o atendimento semi-automático. Mas, entretanto, estamos a pensar outras coisas. Por exemplo, a gestão de stocks, previsão de vendas. A Inteligência Artificial trabalha muito com a previsibilidade, certo? Em empresas de distribuição, na gestão dos stocks, das encomendas e na previsão dos consumos, a IA pode ser muito útil.

A minha questão principal é perceber como é que as empresas estão a olhar para isto, o que é que estão a tentar aproveitar da IA?

Nós temos cerca de 500 developers de código, portanto qualquer coisa que melhore a nossa eficiência no desenvolvimento de código tem um impacto brutal. E esta é uma daquelas. Depois, com os clientes: eu acho que há muitos curiosos neste momento. Neste momento, qualquer coisa que leve o título Inteligência Artificial…Lá dentro depois podem ser máquinas de lavar roupa, mas a malta adora. Há muitos clientes que estão sobretudo curiosos. Ouviram o hype e querem perceber o que é que é. Mas depois, após um primeiro contacto, querem saber em que medida é que a Inteligência Artificial pode afetar a forma como trabalham. O nosso papel é um pouco como mostrar-lhes isso. Quais é que são as ferramentas que têm, como é que as podem utilizar, onde é que podem ir experimentar, etc.

“Agora, tudo o que diz ‘Inteligência Artificial’ tem um apelativo especial. Qualquer empresa hoje quer fazer qualquer coisa com Inteligência Artificial”

Essencialmente, a Glintt é uma empresa de capital humano. Capital humano e tecnologia, exatamente. O nosso valor são as pessoas e a experiência funcional que têm. porque tecnologia sem conhecer o negócio não funciona. Portanto, as pessoas têm que conhecer o negócio para saber como aplicar a tecnologia. O conhecimento funcional que as pessoas têm. por exemplo, nos hospitais é fundamental. Ninguém consegue desenvolver software ou tecnologia para hospitais se não se perceber como é que funciona um hospital. E daí que tenhamos aqui biomédicos, enfermeiros, pessoas que sabem desse negócio. E, portanto, o nosso principal ativo nem sequer está no balanço. Nós olhamos para o balanço e não temos ativos reais, não temos prédios. Os nossos ativos são as pessoas.

E quantas pessoas tem a Glintt neste momento? Quantas conta ter no final de 2024? 

Neste momento nós temos 1.200. Nós somos uma empresa de serviços. E serviços é pessoas, é vender projetos, vender horas. Portanto, para crescer o nosso topline temos que ter mais pessoas. Se nós queremos crescer estes 8 a 10 milhões por ano, vamos precisar, à vontade, de mais 100 pessoas, que é mais ou menos oito a 10% [do nosso quadro atual]. Nós temos uma atividade muito intensa de contratação, o nosso crescimento passa necessariamente por mais pessoas.

é fácil para a Glintt contratar em Portugal neste momento? 

A área de tecnologia está muito aquecida. Há muita gente a contratar…

E muita gente a ir embora… 

Sim. o mercado é global. O teletrabalho provou que empresas de tecnologia podem funcionar, em geral, muito bem, com 100% em teletrabalho. A Glintt foi logo 100% de teletrabalho e os últimos dois, três anos foram os melhores da Glintt. As equipas adaptaram-se a funcionar em trabalho. E agora há muitos portugueses, formados em Portugal, que trabalham a partir de casa, mas para empresas alemãs, holandesas, escandinavas.

Os suspeitos do costume. 

Pagam muito mais. Portanto, eu estou a competir pelas pessoas com esse tipo de empresas. E depois há também outro tipo de empresas a atuar nesta área tecnologia, que eu chamo um bocadinho mais de vão de escada, que pagam muito pouco em recibo e depois pagam ajudas de custo quilómetros, umas alcavalas e conseguem dar a mesma liquidez a um determinado empregado, com um custo muito inferior. Portanto é uma concorrência difícil. Porque a Glintt paga tudo em recibo.

Como é que a Glintt se vê a combater essa tendência? 

Nós? Qual é a nossa vantagem: primeiro temos um projeto e trabalhamos em sectores muito interessantes e a malta da tecnologia gosta do atrativo do projeto. Trabalhar em saúde é muito interessante. Saúde e tecnologia são duas áreas que estão vivas, dinâmicas e a crescer, onde as pessoas gostam dos projetos. Portanto, essa é uma vantagem que nós temos, claramente. Depois, somos uma empresa líder onde atuamos e as pessoas gostam de empresas fortes. E tentamos ter uma remuneração competitiva e um espaço de trabalho atrativo. Fizemos estas obras e o escritório, que era um bocadinho sisudo, agora as pessoas já gostam mais.

Mas como estão maioritariamente em teletrabalho, também vêm cá uma vez por outra.

 Mas passam a vir mais. Eu também quero que as pessoas venham mais. Acho que estar tudo em teletrabalho estraga um bocadinho. E depois, o que é que fazemos? Contratamos bastante e estamos a fazer o que nos fazem a nós. Temos pessoas a trabalhar da América Latina, certo? Se os recursos que temos em Portugal competem connosco, com empresas que estão fora, nós também temos que ir buscar a outras áreas.

Essencialmente Brasil? 

Brasil. E para Espanha, temos muitos da América Latina espanhola: Argentina, Chile e Peru. Há uma grande mobilidade – porque a pessoa pode trabalhar de qualquer lado, para qualquer lado – e, portanto, é um desafio que nós temos. E daí também que nesta área mais da nova Glintt Next, que trabalha esta área de tecnologia para grandes empresas, nós estamos em aumentar a presença no mercado espanhol. Temos clientes em França e estamos a procurar ter uma maior percentagem das nossas receitas em clientes do norte da Europa, para equilibrar a relação entre pressão no custo laboral e depois ter receitas maiores.

Glintt está a olhar para empresas com vista a aquisição? De que sectores? 

Historicamente, nos últimos anos crescemos bastante por aquisição. Parámos um bocadinho em 2022 e em 2023, mas queremos continuar a crescer.

Vai inverter essa paragem [nas aquisições] em 2024? 

Nós gostaríamos que sim. Ou seja, o sim implica que tenhamos oportunidades atrativas para nós. E estamos objetivamente a olhar, porque acho que conhecemos muito bem os mercados onde estamos. As nossas aquisições correram bem. Eu costumo dizer que a aquisição começa quando se assina o contrato, não acaba aí. Vai correr bem ou não, consoante a forma como se gere. Modéstia à parte, provámos que somos bons a gerir aquisições. E, portanto, acho que a aquisição é uma forma muito interessante de complementar a nossa oferta e adquirir mais clientes, porque na nossa área há um custo de adquirir cliente. O cliente sente-se confortável com um fornecedor que já provou que é útil. E, portanto. estamos a olhar proativamente para aquisições em Portugal e em Espanha, e até fora. Porque achamos que é uma boa forma de aumentar o crescimento.

“Nos últimos anos crescemos bastante por aquisição. Parámos um bocadinho em 2022 e em 2023, mas queremos continuar a crescer”

Qual é a próxima grande novidade da Glintt? 

Temos várias. Estamos em processo de lançamento de uma nova plataforma para os hospitais. É uma plataforma de soluções muito mais moderna e sofisticada do que as soluções que nós temos. Já estamos em teste em alguns hospitais em Portugal.

Em que é que ela é mais moderna? 

É mais rápida, há menos erros e, portanto, há uma muito maior facilidade de atuação. É uma nova geração face aos produtos que temos, que já têm alguns anos e que são legacy. Portanto, claramente vai marcar o ano de 2024 na parte hospitalar, não só em Portugal como em Espanha.

E vai ter impacto naquilo que é a performance dos hospitais da rede do SNS? 

Vai. Os hospitais beneficiam muito de tecnologia. De uma forma geral, os hospitais não são daquelas indústrias mais propensas a adotar tecnologia. A banca e as telcos sim, desde sempre. Os hospitais nem por isso. Mas acho que ainda por cima agora, com os constrangimentos que existem, a tecnologia é um excelente auxiliar para aumentar a eficiência dos recursos. E os hospitais estão a começar a perceber isso. Neste momento, quando se vende tecnologia para hospitais, vende- -se muito não só para CIO, mas para toda a Comissão Executiva. Porque se eu conseguir ter ferramentas que consigam, por exemplo, otimizar o bloco operatório, mas também os recursos que são usados no bloco, como a parte a montante, a pré-análise que é feita, a parte a jusante que implica que a pessoa é operada e tem de ter um lugar no recobro. Se eu conseguir ter ferramentas rápidas e eficientes, que otimizem isto, eu, com os mesmos recursos, consigo ter muito mais produção. Portanto, é um ganho claro para o hospital. Os hospitais têm muito a ganhar com a utilização de tecnologia. E na medida em que nós tenhamos ferramentas tecnológicas mais rápidas, mais eficientes e que ajudem os hospitais a ter uma melhor utilização dos recursos, então é um grande impacto no próprio sistema de saúde.

A Glintt anuncia hoje uma mudança nos nomes das empresas do grupo. Porque é que decidiram fazer isto? 

A Glintt cresceu muito por aquisição e, por via disso, criou várias marcas. Nós somos ambiciosos e queremos continuar a crescer mais, com mais clientes, maior oferta e eventualmente novas geografias. Mas sentimos que temos um problema de comunicação, na forma como nos apresentávamos. A nova organização de marcas surge essencialmente para nos ajudar a comunicar as nossas competências, valências e para conseguir crescer mais. Nós chegámos à conclusão que éramos muito fracos em comunicação.

Como assim? 

Os clientes, muitos clientes, não sabiam todas as valências e competências que a Glintt tinha. Tínhamos a marca Nexllence para a área de consultoria tecnológica. E perguntavam, ‘mas a Nexllence é Glintt?’ Era confuso, incluindo para as nossas próprias pessoas. Portanto, o que é que nós decidimos criar? Decidimos criar uma marca que, na minha opinião, é o melhor dos dois mundos. Temos uma marca principal. a Glintt Global, que engloba a Glintt e tudo o que nós temos. Depois criámos duas submarcas: a Glintt Life, para a área da saúde, e a Glintt Next, para a área de consultoria tecnológica de grandes empresas. São todas Glintt: uma é a Glintt Global, outra é a Glintt Life e outra Glintt Next. Garante-se a unicidade e eu, quando contrato, sou Glintter.

Isso permite que tipo de ganhos? 

Por outro lado, ao temos as marcas individualizadas, permite uma comunicação muito mais individualizada das competências, das skills e oferta para os clientes específicos. Eu quando trabalho para clientes como uma EDP ou uma REN ou um BCP, tenho que comunicar determinados atributos e às vezes diziam-me, ‘mas vocês trabalham em farmácias, o que é que isso traz ao Novo Banco?’ Eu consigo trabalhar a comunicação, os eventos e a oferta para esse segmento das grandes empresas. Quando estou na Glintt Life comunico saúde, cuidar. Aí somos uma empresa de HealthTech, de tecnologia da saúde. Portanto, eu acho que isto é uma peça que nos faltava para garantir o crescimento: Clarificar e ter capacidade para comunicar a cada mercado e a cada segmento de clientes, de uma forma clara, as nossas competências para poder endereçar os problemas dos clientes e ao mesmo tempo garantir que somos todos Glintt.

Notícia Jornal Económico 19 de janeiro 2024

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